DONALD TRUMP AMEAÇA RETIRAR OS ESTADOS UNIDOS DA OMS

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, deu um passo além em suas desavenças com a Organização Mundial da Saúde. Em mais um episódio de sua disputa retórica com a China, o líder americano ameaçou retirar seu país da lista dos 194 Estados-membros da OMS caso a organização “não se comprometa com melhorias significativas dentro dos próximos 30 dias”.

Na correspondência direcionada ao diretor-geral da entidade, o médico etíope Tedros Adhanom Ghebreyesus, Trump disse que poderia congelar permanentemente as doações americanas à OMS, que “claramente não vem servindo aos interesses” dos EUA. Ele congelou a verba em meados de abril, sob acusações de que a organização, responsável pela coordenação global da resposta à pandemia da Covid-19, seria pró-China.

Em paralelo, os Estados Unidos rejeitaram parte do texto da resolução aprovada nesta terça-feira (19) pela assembleia geral anual da OMS, que está sendo realizada virtualmente pela primeira vez na história. 

A resolução apoia a possibilidade da quebra de patentes de vacinas ou tratamentos para a Covid-19, citando a Declaração de Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), de 2001, que abre caminho para que países pobres e em desenvolvimento façam o chamado licenciamento compulsório de vacinas e remédios em emergências de saúde, para terem acesso igualitário a tratamentos médicos. A Declaração de Doha já foi usada no contexto do combate ao HIV.

Ao lado de outras nações com indústrias farmacêuticas fortes, como o Japão e a Suiça, os americanos vêm resistindo a quaisquer referências ao assunto, buscando enfatizar o papel da propriedade intelectual na inovação científica. Segundo os americanos, o acesso a qualquer vacina ou medicamento contra o novo coronavírus poderia ocorrer por meio de mecanismos voluntários, como parcerias e doações. No entanto, muitos governos pobres e em desenvolvimento temem que isto seja insuficiente para garantir seu acesso a futuros, e provavelmente caros, tratamentos ou vacinas, prejudicando-os.

A China e a França, por sua vez, posicionaram-se nesta segunda-feira (18) ao lado das nações emergentes, afirmando que qualquer vacina que venha a ser descoberta deveria ser tratada “como um bem público”.

Sem mostrar provas, o presidente americano vem afirmando que a OMS trabalha em consonância com o governo central chinês para esconder a verdade sobre a pandemia. Também sem apresentar evidências, Trump e seus aliados alegam que a China, com o apoio da OMS, não só acobertou informações sobre o vírus, mas teria o fabricado em laboratórios. Tanto Pequim quanto a Organização negam as acusações.

“É claro que os erros repetidos que você e sua organização tomaram na resposta à pandemia custaram extremamente caro ao mundo”, escreveu o presidente Trump em uma carta de quatro páginas. Horas antes, à imprensa Trump havia chamado a OMS de “fantoche da China”.

Na manhã desta terça, um porta-voz disse que a OMS ainda não tem um posicionamento sobre a carta do líder americano, mas que sua resposta terá mais clareza ao longo do dia. Horas depois, a União Europeia manifestou apoio à entidade, afirmando que não é hora “de apontar o dedo” ou de “minar a cooperação multilateral”, mas sim de solidariedade.

A Chancelaria chinesa, por sua vez, acusou Washington de “escolher o alvo errado” ao querer “difamar a China”, usando-a para “fugir de suas obrigações internacionais” para com a OM:

“A carta está cheia de insinuações, de ‘provavelmente’ e ‘talvez’, e tenta usar métodos enganosos para iludir o público, e alcançar os objetivos de desacreditar os esforços antivírus da China e fugir da responsabilidade pela resposta insuficiente dos EUA”, disse Zhao, fazendo uma alusão ao fato de que o país governado por Trump é o mais afetado pela pandemia, com 1,5 milhões de casos da Covid-19 e mais de 90 mil mortes.

Em 2019, os EUA contribuíram com cerca de US$ 553 milhões para o orçamento de US$ 6 bilhões da organização, mais que qualquer outro país, enquanto a China destinou US$ 43 milhões à organização. Horas antes de Trump compartilhar sua carta no Twitter, o presidente chinês Xi Jinping oferecido à OMS US$ 2 bilhões para o combate à pandemia, fazendo um apelo para que outros países também aumentassem suas contribuições.

Na semana passada, Trump havia ameaçado cortar permanentemente os vínculos dos EUA com a China, rompendo o acordo comercial firmado pelos dois países em janeiro. Horas depois, as declarações do presidente foram amenizadas pelo principal conselheiro econômico da Casa Branca, Steve Munchin, que afirmou que o pacto estava “absolutamente” de pé.

Desde antes de se tornar presidente, em janeiro de 2017, Trump tem feito muitas ameaças políticas com pouco embasamento, algumas, de fato, levou à frente, como retirar os EUA do acordo nuclear com o Irã e do Acordo de Paris, mas em diversas outras, não. Segundo analistas ouvidos pelo FT, a tendência é que o presidente intensifique seus ataques à China na reta final para as eleições de novembro. Segundo pesquisas de opinião, o presidente aparece atrás do democrata Joe Biden nas intenções de voto.

Em sua extensa carta, Trump lista uma série de aspectos nos quais acusa a OMS de erro. Segundo o presidente, a organização vem “consistentemente ignorando relatos críveis” de que o vírus estaria se espalhado em Wuhan em dezembro”, além de ter “falhado” ao investigar versões inconsistentes com a oficialmente mostrada pelo governo chinês.

Segundo Trump, o “jogo político” de Tedros frente à Covid-19 foi “mortal” e o único caminho em frente para a OMS depende da organização “demonstrar independência da China. Ao longo das semanas, outros países como a Alemanha, a Suíça e o Reino Unido também demandaram maior transparência do governo chinês frente à pandemia. Em resposta, a organização disse que estuda enviar uma missão à Wuhan, marco zero da doença, para estudar sua origem.     

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