ESTUDO DA FIOCRUZ DIZ QUE A CONFIABILIDADE DOS TESTES RÁPIDOS PARA COVID-19 É BAIXA

Os testes rápidos de detecção de anticorpos para a Covid-19 são ferramentas úteis para estudos epidemiológicos, mas seu uso em clínica médica ainda é controverso. As marcas disponíveis no Brasil, segundo estudo da Fiocruz, têm em média risco relativamente alto para falsos negativos, situação em que o examinado tem o vírus, mas o teste não o detecta.

De acordo com o trabalho, liderado pelo hepatologista Hugo Perazzo, a maioria dos testes disponíveis é capaz de detectar bem anticorpos do tipo IgG, que aparecem nos pacientes tardiamente e se sustentam a longo prazo. O problema maior é com a detecção de anticorpos do tipo IgM, que emergem com cerca de uma semana após os sintomas iniciais. 

“Esses testes podem ser úteis para testagem emergencial durante a pandemia de Covid-19 no Brasil”, afirmam os autores do trabalho. “Mas é importante ressaltar a alta parcela dos resultados falsos negativos de testes que detectam anticorpos negativos para o anticorpos IgM de Sars-CoV-2 no curso inicial da doença, além da escassa validação baseada em evidências em resultados publicados no Brasil”.

Em outras palavras, fazer o teste de anticorpos conhecido também como sorológico, é fácil. Mas a interpretação dos resultados precisa de cuidado.

Os testes avaliados no estudo, publicado na revista “The Brazilian Journal of Infectious Diseases”, eram todos os 16 que já haviam sido aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) antes de abril. Agora, são 43.

Entre os que o trabalho analisou está o da Wondfo, empresa chinesa que forneceu 5 milhões de testes para o governo brasileiro. Ele tem uma sensibilidade declarada ligeiramente melhor que a dos concorrentes (86% contra 82% da média dos outros). Mas isso ainda representa um risco de falso negativo de 14%, considerado alto para uso em clínica médica. 

“E esse teste tem um problema: ele não diferencia IgM de IgG”, diz Perazzo.

Isso quer dizer que, quando alguém testa positivo por essa marca de exame sorológico, o médico não sabe se a pessoa está produzindo anticorpos por causa de uma infecção recente (IgM) ou já se recuperou da doença há tempos e possui anticorpos de longa duração (IgG).

Essa informação pode ser complementada por um exame clínico de sintomas, afirma o médico, mas é um fator a mais a considerar para quem usa o teste.

De modo geral, infectologistas não recomendam a conclusão de processos diagnósticos apenas com exames sorológicos. O ideal é ter o teste RT-PCR, que detecta a presença do vírus ativo no organismo por meio de seu material genético.

Testes sorológicos, por serem fáceis de aplicar (em geral com uma picada no dedo para extrair uma gota de sangue), são muito mais práticos para uso em grandes pesquisas. O levantamento da Universidade Federal de Pelotas, que busca estimar a incidência da Covid-19, por exemplo, usa os testes da Wondfo.

“Mas o teste sorológico, para fins individuais, é uma porcaria”, ressalta o infectologista Mauro Schechter, professor titular da UFRJ. “Usá-los para avaliar uma população grande como um todo está tudo bem. Depende de qual objetivo você tem com o teste. Uma coisa é acompanhar a doença em uma população, outra coisa é fazer diagnóstico clínico para um só indivíduo”.

O Ministério da Saúde afirmou que os testes da Wondfo seriam usados inicialmente para fazer triagem de profissionais de saúde infectados pelo novo coronavírus, para decidir quando podem voltar a trabalhar. “Esse teste foi analisado pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), da Fiocruz, e obteve parecer satisfatório”, afirma o boletim epidemiológico do Ministério da Saúde em 09 de abril.

A Celer, empresa de biotecnologia que importa o teste da Wondfo para o Brasil, emitiu um comunicado em seu site destacando a informação: “O instituto de pesquisa não encontrou nenhum falso negativo em amostras analisadas do teste, isto é, 100% apresentaram o resultado esperado”.

A nota da empresa, porém, omite a informação de que o laudo emitido em 05 de abril pelo INCQS tinha como base o desempenho do teste em somente 18 indivíduos.

“Uma análise com 18 amostras é nada. Não posso garantir que aquilo funciona 100% baseado em 18 amostras. Precisa de um cálculo amostral, que chegaria a um número muito maior do que 18, para validar um teste”, explica Perazzo.

Outro uso que está sendo considerado para testes sorológicos é nos países que buscam conceder liberdade de circulação a pessoas com anticorpos IgG contra a Covid-19. Em tese, essas pessoas estariam imunes ao vírus e não contribuiriam para sua disseminação, mas a ideia é controversa.

“É preciso saber se aquele anticorpo específico dosado naquele teste protege o indivíduo e qual o nível protetor. Não se sabe se a infecção natural por Sars-CoV-2 leva a uma proteção nem quão duradoura essa proteção é”, diz Schechter.

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